PONTO DE VISTA.
O mundo acompanhou com muita apreensão, nas últimas três semanas, o embate político no Congresso Norte-Americano a respeito da aprovação da elevação do teto da dívida federal dos Estados Unidos, para além dos atuais 14,3 trilhões. Essa apreensão que tomou conta dos mercados mundiais foi, e ainda é plenamente justificada, em se considerando que os E.U.A., são a maior economia mundial, são os maiores compradores dos produtos do mundo inteiro e a sua moeda, o dólar, é o padrão monetário internacional, além de vários países, principalmente a China, bem como o Brasil, serem detentores de uma enorme quantidade de títulos da dívida americana.
Aquilo que parecia inviável de se pensar, até bem pouco tempo atrás, tornou-se uma possibilidade ameaçadoramente concreta: um calote norte-americano. Não é difícil imaginar que no caso de uma moratória norte-americana, teríamos uma catástrofe de proporções realmente muito difíceis de prever, considerando que o momento econômico pelo qual passam as outras potências líderes do capitalismo mundial não é dos melhores, onde temos a Europa acossada pela crise das dívidas de Grécia e Portugal, pela situação delicada de Irlanda e Espanha, somadas aos primeiros sinais de problemas que batem à porta dos italianos, levando risco à própria existência do euro.
No Extremo Oriente a situação também não é das melhores, uma vez que temos o Japão mergulhado nos problemas econômicos e nucleares advindos da catástrofe do início do ano e uma China também às voltas com uma pequena, mas sensível, queda no seu ritmo de crescimento e já vislumbrando uma impossibilidade de manter a cotação artificial do yuan.
O que salva a cena, por mais incrível que possa parecer, é a América Latina, que em função de uma relativa estabilidade política, e do favorecimento econômico proporcionado pela valorização das comodities no mercado internacional, que permitiram programas assistenciais governamentais que atenuaram um pouco a má distribuição de renda, principalmente no México, Colômbia, Perú e Brasil; consegue oferecer uma relativa segurança aos investidores.
Dentro deste pouco propício contexto mundial, a discussão sobre a aprovação do projeto de aumento do teto da dívida federal americana revestiu-se de especial importância sob vários aspectos, inclusive o político, pois com as eleições presidenciais do ano que vem à porta, o presidente Obama não podia nem sequer sonhar com a não elevação desse teto, pois a situação ficaria tão desesperadora que seria impossível ao tesouro americano honrar seus compromissos de custeio, como por exemplo, o pagamento das aposentadorias e pensões.
O debate na Câmara dos Representantes entre republicanos e democratas, expôs ao mundo o grau de polarização política existente neste país, pela marcante diferença entre as soluções pretendidas por cada um desses partidos para a crise. Os republicanos defendendo um corte brutal nos gastos públicos, principalmente em programas assistenciais, uma administração mais espartana dos recursos financeiros da nação e o não aumento de tributação, mesmo dos mais ricos. Já os democratas defendiam a manutenção deste assistencialismo, apresentando a conta à sociedade via aumento dos impostos, principalmente dos mais ricos, dispensando desse modo um controle mais fechado sobre as contas públicas.
O Partido Democrata, embora seja o de presidente, não conta com maioria nas casas legislativas e trabalhou desesperadamente pela aprovação do aumento do teto da dívida federal, para não ser destroçado nas eleições do ano que vem, tentando qualificar o Partido Republicano como oportunista, pelo fato de não apoiar a essa aprovação nos moldes defendidos pelos democratas, estratégia desmascarada e combatida pelo “Tea Party”, ala mais radical republicana. A verdade é que, num momento em que o país ainda nem saiu da crise de 2008/2009, sobretaxar aqueles capazes de realizar os investimentos necessários na produção, essenciais à recuperação econômica plena da nação, sem uma austeridade na aplicação do dinheiro público para custear assistencialismo, é dar uma recepção à sorte sem precedentes na História Econômica.
Após uma última semana dramática, pela aproximação da data limite para a aprovação do projeto em discussão (02/08/2011), na véspera deste prazo expirar chegou-se a um acordo, aprovado pela Câmara dos Representantes, no qual o teto da dívida será elevado em duas etapas de 900 e 400 bilhões de dólares respectivamente; os cortes no orçamento serão feitos numa primeira etapa de 917 bilhões de dólares e numa etapa subseqüente de 1,5 trilhões de dólares; e será criada uma comissão bipartidária para definir onde se farão esta última fase dos cortes de gastos, até o fim do ano que vem e em caso de impasse já estão negociados os cortes automáticos no programa “Medicare” de saúde e no Pentágono.
Como resultado, Obama e seu Partido Democrata saíram enfraquecidos; o “Tea Party” ganhou mais força no Partido Republicano e no cenário político nacional, o mundo descobriu que os americanos podem quebrar sim e ao mesmo tempo em que respirou aliviado, se deu conta do tremendo erro cometido em 1944, quando foi definido o Sistema Bretton Woods de Gerenciamento Internacional, que estabeleceu as regras para as relações comerciais e financeiras entre os países mais industrializados do mundo, como base para a reconstrução do capitalismo após a Segunda Guerra Mundial.
Definindo um sistema de regras, instituições e procedimentos para regular a política econômica internacional, os planificadores de Bretton Woods estabeleceram o Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento (International Bank for Reconstruction and Development, ou BIRD) (mais tarde dividido entre o Banco Mundial e o "Banco para investimentos internacionais") e o Fundo Monetário Internacional (FMI). Essas organizações tornaram-se operacionais em 1946, depois que um número suficiente de países ratificou o acordo.
As principais disposições do sistema Bretton Woods foram, primeiramente, a obrigação de cada país adotar uma política monetária que mantivesse a taxa de câmbiode suas moedas dentro de um determinado valor indexado ao dólar —mais ou menos um por cento— cujo valor, por sua vez, estaria ligado ao ouro numa base fixa de 35 dólares por onça Troy, e em segundo lugar, a provisão pelo FMI de financiamento para suportar dificuldades temporárias de pagamento. Em 1971, diante de pressões crescentes na demanda global por ouro, Richard Nixon, então presidente dos Estados Unidos, suspendeu unilateralmente o sistema de Bretton Woods, cancelando a conversibilidade direta do dólar em ouro.
O que Bretton Woods representou foi, sem levar em conta as turbulências cíclicas do capitalismo, inerentes à sua própria natureza sistêmica; o atrelamento de todo o sistema econômiico mundial aos Estados Unidos, uma vez que se transferia do chamado “Ouro Monetário” para o dolar, o padrão internacional para se mesurar a riqueza de uma nação, colocando a economia mundial refém da economia norte-americana, o que dá margem à situações como a que acabamos de viver relativa à questão da possibilidade de um calote do Tio Sam, que mesmo após o anúncio do acordo político que evitou este calote, continua gerando intranquilidade nos mercados em função do acordo da dívida ser um paliativo que não esconde os seus efeitos colaterais de enfraquecimento econômico americano, que, por causa de Bretton Woods, representa risco e enfraquecimento das economias de todo o globo.
Na época, 1944, apenas uma voz se ergueu para contestar os acordos de Bretton Woods, prevendo todas as consequências dele elencadas acima: O General Charles D’Gaulle, figura emblemática da guerra que chegava ao seu final, criador da Resistência Francesa dentro e fora da França, estrategista brilhante que previu a guerra mecanizada que ainda estava sendo travada, enfim, uma lenda viva.
O “General da França” gritou aos quatro ventos que Bretton Woods seria um suicídio político e econômico pela entrega da economia do mundo a uma única nação, os Estados Unidos, e que tal entrega teria conseqûencias desastrosas no futuro, pela própria natureza do Sitema Capitalista, sujeito a crises periódicas, que um dia afetariam este país tão fortemente quanto a crise do “Crack da Bolsa” de 1929, levando o resto do mundo de roldão e colocando os países na falência economica e moral.
Interessante, justamente tudo o que esteve bem perto de acontecer agora...
É indiscutível, o D’Gaulle tinha razão.
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