Não é a primeira vez que abordamos temas relacionados à política econômica do atual governo, tendo em vista que a volta de uma inflação de consumo ou de demanda, como queiram, trouxe justificadas apreensões não apenas aos especialistas da área, mas, principalmente, à população em geral que tendo se habituado a uma estabilidade nos preços e serviços do seu dia a dia, se alarmou ante o início da volta da corrosão dos seus rendimentos, pelo maior causador de instabilidade monetária e social de um país: a espiral inflacionária.
Para não sermos enfadonhos, não vamos discorrer, nesta oportunidade, sobre os motivos que ressuscitaram o dragão da inflação, pois já o fizemos anteriormente, frisando que o importante agora é uma breve análise dos ajustes e reajustes que a equipe econômica da Presidente Dilma tem feito, para equilibrar o binômio “Controle Inflacionário X Manutenção do Crescimento Econômico”.
Já sabemos que a continuidade dos artifícios que garantiram os níveis de consumo na crise de 2008, aliados aos bem ampliados programas assistencialistas do governo anterior, que custaram 116 bilhões aos bolsos dos contribuintes (enquanto o total de investimentos federais foi de apenas 44,6 bilhões) foram prolongados além da conta, gerando um balão de crescimento não lastreado pela capacidade produtiva da nação, o que fez com que a meta de inflação de 4,5% ao mês chegasse a 6,5%, acendendo o sinal amarelo para os economistas do governo que se defrontam com a necessidade de levar a inflação de volta ao centro da meta, o que só pode ser feito paulatinamente, já que qualquer movimento abrupto neste sentido tende a uma recessão; contando com uma conjuntura mundial da economia favorável ao Brasil, como a supervalorização das commodities pela crescente demanda de matérias-primas, principalmente pela voracidade chinesa.
As medidas restritivas ao consumo com a elevação da taxa básica de juros, que se refletiu numa queda, menor que o previsto, nos níveis de consumo, não surtiu o efeito desejado para a convergência ao centro da meta, muito embora o IPCA divulgado em 15 de outubro seja esperado em torno de 7,15%, ainda gera incerteza de que até dezembro a taxa em 12 meses comece a caminhar para a meta ou para abaixo dela. Preocupa-nos o fato de que esta conjuntura favorável começou a mudar. A ameaça de quebra da maior economia do mundo, os EUA, associada a preocupante conjuntura econômica dos países da União Européia, em especial a Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha e mais recentemente a Itália, que coloca em xeque a União Européia, sua integração política e viabilidade econômica, caso não consiga se ajustar à nova realidade, se tornará bastante provável que seja decretado o fim do Euro, cuja as consequências para a economia mundial se tornam extremamente preocupantes, face o Japão se encontrar enterrado em recentes desastres naturais sem ter ainda absorvido as tragédias que o vitimaram no início deste ano; a China tendo que reduzir seu crescimento, que segundo as projeções dos economistas deve ficar em torno dos 8%, por correr o risco de uma crise de superprodução, para tentar atenuar os efeitos da desvalorização artificial da sua moeda e, principalmente, por precisar segurar uma alta inflacionária que fez seu governo promover um ajuste interno, enfim, em outras palavras, um cenário recessivo que, segundo os analistas, durará ainda alguns anos.
Os próprios BRICS já não são a maravilha do século XXI, como vinham sendo encarados há bem pouco tempo. Esta situação se traduz, na prática, numa desvalorização das commodities pela redução significativa na sua procura, com a consequente retração nas exportações em geral e queda inevitável nos níveis de crescimento mundial.
O primeiro sinal grave de que o Brasil não está imune, como se pensava, às turbulências internacionais foi a súbita alta do dólar nos derradeiros dias de setembro último, que embora fosse desejada por muitos exportadores do agronegócio, mas de forma dosada e controlada, quase levou à quebra importantes grupos industriais nacionais, entre os quais, a Klabin que acumulou prejuízos que atingiram a casa dos 687 milhões de reais, obrigando o governo a intervir, cumprindo a promessa feita pelo Presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, de baixar medidas para a redução desta alta, que trouxe instabilidade nos mercados, além da possibilidade de setores altamente dependentes de insumos importados, como o de eletroeletrônicos por exemplo, terem a necessidade de rever seus custos de produção, repassando-os para o consumidor, gerando desse modo mais inflação, o que não ajuda a se alcançar a meta, devendo o governo em seguida, segundo Edmar Bacha, Ex-Presidente do Banco Central, usar suas reservas para evitar uma desvalorização excessiva do Real e seus impactos inflacionários. Outro problema é a manutenção do preço artificial da gasolina, cuja demanda aumentou muito nos últimos anos pelas facilidades na aquisição de automóveis; defasado em relação aos outros derivados do petróleo, que majorados na devida proporção, pesam nos custos industriais e subsidiam esta artificialidade no preço da gasolina, mas que se refletem nos preços de tudo o que vai para a nossa mesa, devido ao aumento no valor dos fretes, uma vez que os caminhões que transportam as mercadorias pelas estradas de todo o Brasil são movidos a óleo diesel.
Nada do exposto acima ajuda a chegar ao centro da meta, mas de acordo com a Lei de Murphy, que pontifica que nada é tão ruim que não possa ser piorado, temos ainda um cenário que nos faz viver o título de uma das maiores obras sobre Economia de todos os tempos: “A Era da Incerteza” de John Kenneth Galbraith, considerada antológica a ponto de se tornar uma série da BBC para televisão.
O aumento do IPI dos veículos importados em 25%, na média, concedido pelo governo sob evidente pressão do lobby das montadoras nacionais, foi um grande desestímulo ao desenvolvimento de um livre mercado competitivo, além de propiciar um bônus inflacionário, uma vez que os consumidores de carros importados mesmo com o aumento não só dos preços de aquisição, mas também dos custos de manutenção, dificilmente voltarão a adquirir os carros que, ainda sem chegar aos níveis de qualidade dos estrangeiros, são produzidos pela indústria nacional. Com a participação de 6% no mercado brasileiro, os importadores de veículos já foram penalizados com o aumento do dólar e, tendo em vista o investimento feito e os empregos gerados pela rede de distribuição e oficinas, seria muito conveniente a revisão dessa medida, já contestada na justiça e que faz do Brasil alvo de possíveis sanções da Organização Mundial do Comércio – OMC.
Contudo, o maior fator de risco para as pretensões do Ministro Guido Mântega em por um freio na inflação reside no fato de não conseguir resistir às pressões da Presidente Dilma, defensora da manutenção do crescimento a qualquer preço, mesmo a custa do risco de alta de inflação, fazendo lembrar o projeto desenvolvimentista do Presidente Juscelino Kubitschek que implantou um processo inflacionário que só foi debelado com o Plano Real.
Num lance muito arriscado, face à situação de crise que já se firma no horizonte e cuja gravidade ninguém pode prever, num momento em que os aumentos recentes da taxa de juros não se mostraram plenamente eficazes em trazer os índices inflacionários para a meta; o governo decide reduzir em 0.5% a taxa básica de juros. Considerando a taxa de inflação acumulada, esta medida causa calafrios em qualquer um que tenha a mínima noção de economia, sendo que com a promessa de um aumento de 14% do salário mínimo combinada a uma provável materialização de uma recessão mundial, cujo alcance ainda não é possível prever, mas que, ao que tudo indica, será muito provavelmente mais profunda e duradoura que a crise que assolou o mundo em 2008, usada como desculpa para justificar a medida mencionada, sob alegação de que com a retração do mercado mundial há que se fortalecer o mercado interno. A pressão da mencionada fórmula de reajuste do salário mínimo sobre os serviços, cujos custos se tem mantido acima da média dos outros itens que pesam no orçamento das pessoas, faz muitos economistas discordarem do governo, lembrando sempre que ainda não se falou em um controle sério dos gastos públicos, condição sine qua non para qualquer tentativa bem sucedida de segurar a inflação, o que, vale dizer, ainda não ocorreu pelo menos na proporção necessária às necessidades de adequação financeira e fiscal do gigante Estado Brasileiro.
Ao que se pode ver, os ajustes e reajustes na economia passam, mas as incertezas permanecem...
Resta apenas saber por quanto tempo.
Amaury Cardoso
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