sexta-feira, 7 de março de 2008

GOVERNO DILMA – 100 DIAS DE ACERTOS E INCERTEZAS. Artigo / Maio de 2011

PONTO DE VISTA.



Completamos o primeiro ciclo de avaliação de qualquer governo, os primeiros 100 dias, período no qual já se pode observar a orientação de um governante quanto a várias questões de natureza política e econômica, bem como a outras consideradas num contexto mais amplo da sociedade.

No que diz respeito ao governo Dilma, esses primeiros 100 dias já acumularam alguns acertos, principalmente no tocante à política externa, no entanto, deixa ainda muitas incertezas no campo econômico, na questão ambiental e, politicamente, na administração de conflitos entre ministérios e a direção de empresas do governo, que causam certa instabilidade nos mercados e, portanto, prejuízos aos investimentos e aportes de capital necessários à solução dos grandes gargalos que insistem em obstruir o pleno desenvolvimento econômico e social brasileiro.
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Em termos de política externa, o atual governo já adotou algumas diretrizes mais coerentes com a tradição diplomática brasileira, que nunca foi favorável a regimes de força e que patrocinem atos de terrorismo e autoritarismo, se afastando da diplomacia lulista que era propensa a relações questionáveis com Hugo Chaves da Venezuela e Ahmadinejab do Irã, campeões em arbitrariedades, mundialmente reconhecidos como protagonistas de violações dos direitos humanos que vão de fraudes eleitorais até o apedrejamento de mulheres, passando por perseguições políticas e cerceamento da liberdade de imprensa.

A reação da presidente Dilma às tentativas de ingerência da Organização dos Estados Americanos- OEA relativas à hidroelétrica de Belo Monte, foi condizente com a postura de um país soberano, mas não elimina as graves questões ambientais e sociais envolvidas na sua construção e que, sem sombra de dúvida, devem ser reavaliadas pelo governo, que não pode insistir num modelo de desenvolvimento que não seja pautado na sustentabilidade e no respeito aos ecossistemas existentes. Sabe-se que isto é possível, resta saber se o novo governo também entende deste modo.

Dilma retoma, também, a proximidade com os Estados Unidos, tradicional parceiro brasileiro, grande importador dos nossos produtos, que foi preterido pelo governo anterior em favor de um maior estreitamento nas relações com a China, principalmente no que diz respeito ao comércio; sendo a recente visita do Presidente Obama ao Brasil um claro sinal de reaproximação entre os dois países.

Falando em China, a recente visita que a nossa presidente fez a este país foi um sinal claro de que o novo governo pretende, na medida do possível, estabelecer um patamar mais favorável ao comércio exterior brasileiro com os chineses. Atualmente, a China é o nosso maior parceiro comercial, contudo, os cinco bilhões de dólares de superávit do comércio sino-brasileiro no ano de 2010, denotam uma vantagem ilusória, pois nossas exportações para este país são constituídas em 83% de produtos básicos, que tiveram grande valorização nos últimos anos e, por isso, compensaram, em termos de lucratividade, a redução do volume das compras chinesas de matérias-primas. Não há como deixar de mencionar a estranheza que nos causa à voracidade chinesa por commodities, porque sabemos ser a China riquíssima em recursos naturais, principalmente na região da Manchúria, o que talvez nos induza a pensar que os chineses estão agindo de modo semelhante aos norte-americanos em relação ao petróleo, que importam dos outros países, preservando as suas reservas petrolíferas no Alaska. Será?

O que este superávit não evidencia, é que a nossa participação no comércio exterior chinês é de apenas 2%, e nossas importações da China correspondem em 97% de produtos manufaturados e, portanto, com um valor agregado que majora em muito o seu custo. Não se pode negar que os contratos para a compra de 450 jatos da EMBRAER pelos chineses, e para exportação da nossa carne suína, representam um avanço para o estabelecimento de um equilíbrio no comércio bilateral Brasil-China, mas ainda são insuficientes para chegarmos a tal equilíbrio, inclusive em função da baixa produtividade da indústria brasileira, que credencia poucos fornecedores a inserirem produtos com valor agregado no competitivo mercado chinês. A própria questão da carne suína é um demonstrativo disto, pois dos 26 frigoríficos credenciados à avaliação dos chineses para a importação, só 13 foram visitados e apenas 03 foram habilitados a exportarem para a China. Outra questão é o apoio chinês à concessão de um assento permanente para o Brasil no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas, apoio este agora mais explícito, muito embora a resistência chinesa para uma declaração nesse sentido existisse para não favorecer as pretensões japonesas que pleiteiam um assento, alterando a correlação de forças no sudeste asiático. Contudo, mesmo levando-se em conta todas estas questões, é inegável que as novas, embora pequenas, redefinições no nosso comércio com o “Gigante Amarelo” representam um efetivo progresso, conseguido com a consciência das nossas atuais limitações e do nosso potencial de uma ampliação maior, futuramente, das vantagens auferidas pelos negócios com os chineses.
Se temos motivos para comemoração quanto aos resultados da diplomacia brasileira, nesses 100 primeiros dias de governo, o mesmo já não se pode dizer quanto à política econômica da nova presidente. Um fantasma antigo, que já tem um histórico perigoso e nefasto na economia brasileira, está de volta e com uma força inimaginável desde a implantação do Plano Real: a inflação. As corretas medidas do governo anterior tomadas para blindar a nossa economia da crise de 2009, ou seja, isenções fiscais e redução no IPI de vários produtos industrializados, de modo a manter estáveis os níveis de consumo revitalizados pela recuperação do poder de compra da população e pela inclusão no mercado interno de uma parcela do povo brasileiro, graças à ampliação de programas assistenciais do governo FHC, que não tinha acesso aos bens de consumo que não podia possuir, por não ter renda. A estratégia funcionou, mas era uma mágica com prazo de validade. Atualmente, o feitiço virou contra o feiticeiro, pois o superaquecimento da economia, com crédito fácil, prazos elásticos para pagamento, mas com o aumento do valor dos insumos industriais que automaticamente foram repassados aos produtos industrializados, ao mesmo tempo em que os produtos agropecuários também tiveram a majoração dos seus insumos, fato que, aliado às flutuações climáticas que afetam diretamente a produção do setor, elevaram os preços da alimentação, ressuscitando a indexação, que gera a espiral inflacionária. O mais grave é que, ao mesmo tempo, houve um aumento nos gastos públicos, transformando o remédio em veneno. Agora, a equipe econômica tenta conter o consumo aumentando um imposto, o IOF, que vai encarecer as compras no crediário, medida que já se mostrou sem efeito, porque o povo prefere endividar-se a renunciar seus sonhos de consumo, num momento em que houve um gradual aumento real nos salários. O ministro Guido Mantega se encontra desacreditado no mercado, o que torna a situação mais delicada, gerando incerteza, até mesmo pelo conflito com o presidente da Petrobrás, José Gabrielli, pela insistência em manter o preço da gasolina congelada (subsidiada) como ferramenta para conter a inflação, numa conjuntura de alta de preços internacionais do petróleo, e com seus outros derivados já reajustados, colocando o ministro da fazenda numa encruzilhada: se o preço da gasolina subir, a inflação sobe junto; se for mantido, fica artificialmente distante da realidade dos outros derivados, não impedindo, em função disso, o aumento da inflação. Gabrielli se coloca veementemente contra essa estabilidade irreal no preço da gasolina, inclusive pelo aumento de consumo, causado pela elevação nas vendas do setor automotivo, chegando a níveis de consumo que até mesmo com a entrada em operação das novas refinarias, previstas para 2012 no Rio Grande do Norte, 2013 em Pernambuco e em 2014 para o Ceará e o Maranhão e Rio de Janeiro, que juntas aumentarão a nossa capacidade de refino de 1,2 milhão para 3,2 milhões de barris/dia, será difícil de atender e isso somado aos problemas no abastecimento de álcool hidratado, que movimenta 51% da nossa frota de automóveis. O realinhamento dos preços dos combustíveis aumentará a arrecadação do governo, o que pode ajudar no caixa, desde que se faça um efetivo controle dos gastos públicos, mas sabemos que o aumento do diesel, da nafta, do gás natural e de outros derivados do petróleo, terá impacto direto sobre os custos da indústria e do transporte rodoviário, o que provocará, por menor que seja o repasse para o consumidor, uma alta nos preços.

Por fim, não se pode esquecer que o controle de gastos da máquina pública tem que disponibilizar recursos para a aplicação em gargalos de solução inadiável como a saúde e a educação. Segundo o economista Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, e Pedro Cavalcante Ferreira, professor da Fundação Getúlio Vargas, em artigo recente, o governo, a partir de 2008, tem dado sinais de querer ressuscitar o modelo de crescimento que vigorou entre os anos 50 e 80, que levou o país a penosos períodos de crise. Concordo com a visão de um segmento pragmático, na qual a escolha correta é a de que o governo deva ajustar suas contas, ou seja, racionalizar os gastos públicos, investir com mais vigor em educação e qualificação profissional e, finalmente, criar condições para a expansão do investimento, que atualmente encontra-se na casa de 18% do PIB, para cerca de 23% até 2020.

Após os primeiros 100 dias do governo Dilma, parece que apesar das certezas quanto à orientação da nossa política externa, permanecem no ar muitas dúvidas sobre a questão econômica e sobre a manutenção ou elevação dos níveis de crescimento imprescindíveis à estabilidade econômico-social da nação brasileira, para podermos lograr atingir à condição de grandeza e riqueza que confirmarão a nossa vocação de protagonistas no contexto internacional.


Amaury Cardoso
E-mail: amaurycardosopmdb@yahoo.com.br
Blog: www.amaurycardoso.blogspot.com

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