sexta-feira, 7 de março de 2008

O COMANDO DE UMA EMPRESA PÚBLICA. Artigo / Mai de 2010

PONTO DE VISTA.


Normalmente a empresa pública, ou de economia mista, é dirigida por políticos do partido que se encontra no poder ou partidos aliados. Logo, a principal preocupação dos membros de sua direção é satisfazer os interesses políticos de quem lhe nomeou. Se a política do governo é priorizar o atendimento das populações faveladas, por exemplo, toda a empresa é voltada para esta finalidade política, passando a negligenciar as demais atividades, o que sempre provoca um desequilíbrio na sua estrutura organizacional. Os setores não diretamente ligados ao atendimento das populações faveladas são considerados secundários e passam a ser um entrave ao trabalho dos que tratam das prioridades políticas. Um outro fato é o de muitos utilizarem o cargo para se destacarem politicamente e até construírem uma base eleitoral para o futuro. Não é, pois, a insuficiência de recursos humanos, mas sim o não aproveitamento destes recursos que torna ineficiente a empresa pública. Não são também os diretores ou gerentes destas empresas os responsáveis pelas suas deficiências, mas sim a subordinação deles aos interesses políticos estranhos aos seus objetivos. É uma questão não apenas estrutural, mas também conjuntural.

Se o comando das empresas públicas é político e não empresarial, se seus recursos humanos não são corretamente distribuídos, se seus gerentes estão mais preocupados em dar a impressão de estarem fazendo alguma coisa do que mesmo gerenciar, surpreende-nos o fato de que estas empresas venham mal ou bem, cumprindo sua tarefa de defender os interesses ou atender às necessidades da sociedade, algumas até com razoável desempenho. Na busca de uma causa para este intrigante fenômeno tivemos que parar na abnegação dos seus empregados que, apesar de tudo isso, vem conseguindo apresentar uma produção visível. Esta opinião, no entanto, não é corroborada pelos políticos nem pela própria sociedade que atribuem à inoperância das empresas públicas exatamente a seus empregados subalternos.

Tendo em vista tudo o que já foi exposto, vemos que tanto no caso de uma empresa pública unipessoal, com patrimônio próprio e capital exclusivo da união; como no caso da empresa de vários sócios governamentais minoritários, que juntam seus capitais ao da união, sendo esta a detentora da maioria do capital votante; como naquela originalmente criada pelo Estado ou que foi objeto de transformação de autarquia ou empresa privada; em todos os casos é patente que o problema relativo tanto à sua eficiência quanto à sua eficácia em atender às finalidades sociais que justificam a sua existência, não está vinculado ou é causado pela sua natureza pública, mas, evidentemente, pela gestão equivocada, no mais das vezes, dos seus recursos humanos, geralmente distribuídos e gerenciados para atender a fins políticos totalmente diversos, quando não antagônicos, aos interesses da sociedade que deveriam atender. Vale lembrar que uma das primeiras lições em qualquer curso de administração é. “Administrar é lidar com pessoas”.



No aspecto que envolve a empresa pública e o funcionalismo público muito se tem discutido e teorizado acerca dos rumos da Administração Pública diante das questões do mundo contemporâneo. Estado mínimo, burocracia, economia de mercado, etc. neste cenário – no qual se movem sociedades como a brasileira – o “privado” vai ganhando espaço como ideal a ser alcançado, deslocando o sentido de “público” para a obsolescência e corrupção. Promove-se uma associação apressada entre o processo de privatização (terceirização) e a garantia de eficiência por esconder as mazelas próprias de qualquer estrutura mal administrada, seja pública ou privada.

Administrar o espaço público – empresas, instituições, bens – significa, porém, mais que enfrentar a idéia de privado como modelo. Internamente, a qualidade de serviço prestado ao público é dependente daqueles que prestam, de como vêem seu trabalho, e do enfoque que sustentam seu agir. Estes não são obviamente seres estranhos à sociedade, isto é, convivem com desprestígio e a deterioração da imagem do funcionário público e, anonimamente, acabam partilhando a descrença em si mesmo e em seu fazer.

A luta por um serviço público de qualidade passa, portanto, pelo sentido que este serviço tem em determinado momento histórico e, especialmente, pelo sentido que tem para as pessoas que o fazem existir. Administrar este serviço é administrar pessoas que estruturam sua imagem profissional sobre um alicerce muitas vezes em ruínas.

Entendo que de todos os desafios que se colocam aqueles que se lançam à tarefa de desenvolver um trabalho de qualidade no serviço, talvez um mais complexo seja enfrentar o desmonte que se processa internamente, através de um processo de “contaminação” e desmobilização pela descrença.

Com a complexidade das sociedades contemporâneas e as constantes re-elaborações das regras do jogo – hoje chamado de neoliberalismo – o suposto ideal de liberdade e autonomia, também se redefine por um questionamento e afastamento cada vez maior da base moral interior. O homem abre mão de seus antigos referenciais sociais e culturais e tudo é colocado em dúvida, numa lógica pragmática que vai esvaziando de sentido os rituais e as relações entre os homens. Trata-se de uma dialética fragilizante que acaba pondo em questão o próprio valor dos “valores”, em uma perspectiva meramente formal e legalista, desumanizadora.

A se crer que tudo possa ser comprado ou vendido, isto é, se tudo tem um dono e um preço, se a acumulação é estimada, sem limites, não há compatibilidade possível com a idéia de “público”. Há uma compreensão mediada ideologicamente pelos interesses hegemônicos. Assim, aspectos acessórios acabam sendo transformados em necessidades, em desejos coletivos, em sonhos de consumo, em realizações de projeto de vida. Ter vários apartamentos, carros ou pares de sapatos, se equivale na lógica do sucesso. Posso ter trinta cobertores, apesar de apenas um corpo para agasalhar, e olhar sem culpa para aqueles que morrem de frio sob o viaduto. Para a lógica capitalista, acumular é símbolo da sapiência e mérito; estar sob o viaduto é problema do “governo” e das autoridades, quando não da incompetência e falta de esforços do próprio miserável. Mesmo aos funcionários públicos – marajás ou empoeirados, mas representados como pouco eficientes e competitivos – cabe esquecer que tem responsabilidades na vida pública assim que o expediente termina.

Partindo da visão por nós colocada para análise, não é fácil perceber dentre os grupos de funcionários que atuam nas instituições e empresas públicas muitas diferenças. Apesar da aparência massificada, apresentada sob rótulo “Servidor Público” cada vez mais se percebe uma demanda pela diferenciação.

É um momento de crise. As propostas de reformas administrativas patrocinadas nos governos anterior e no atual têm servido mais para empurrar para a aposentadoria um número crescente de servidores que para corrigir as conhecidas mazelas do setor público.

Amaury Cardoso.
e-mail: amaurycardosopmdb@yhaoo.com.br
Blog: www.amaurycardoso.blogspot.com

Um comentário:

  1. Interessante esse seu texto, meu caro Amaury Cardoso! Parabéns e que vc tenha basntante alegria.

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