sábado, 6 de setembro de 2025

PODERIAM ALGUNS AJUSTES NAS INSTITUIÇÕES REPRESENTATIVAS RESTAURAR A CONFIANÇA NELAS? - Artigo: setembro/2025


A democracia é um fenômeno histórico. Desenvolveu-se em condições específicas e sobreviveu em alguns países à medida que essas condições evoluíam, mas será capaz de sobreviver em quaisquer circunstâncias?

Muito se tem falado na crise da democracia, minhas observações e pesquisas sobre esse tema me levaram a certeza de que na realidade, a participação eleitoral está em declínio em muitos países, atingindo níveis jamais vistos. A confiança nos políticos, nos partidos, nos parlamentos, nos governos e nas instituições vem diminuindo ao ponto, no meu entender, de enfraquecer a democracia como sistema de governo. Os sinais visíveis de que a democracia está em crise ficam claros na perda súbita de apoio aos partidos estabelecidos, diminuição da confiança popular nas instituições democráticas e nos políticos, conflitos explícitos sobre instituições democráticas e na incapacidade de os governos manterem a ordem pública e impedir o seu colapso sem utilização da repressão.

Adam Prezeworski, professor de política e economia e estudioso da democracia, entende que a probabilidade de uma democracia ruir diminui rapidamente à medida que o país acumula a experiência de alternâncias pacíficas no cargo como resultado de eleições. Entendo que há sinais de que podemos estar vivendo uma crise no sistema democrático em virtude de alguns fatores que estamos presenciando, a exemplo: I- o rápido desgaste dos sistemas partidários tradicionais; II- o avanço de partidos e atitudes xenofóbicas, racistas e nacionalistas e III- o declínio no apoio à democracia em pesquisas de opinião pública.

Os sinais que aponto acima estão embasados no fato da ocorrência do aumento do número efetivo de partidos desde o começo dos anos 1980, com uma tendência de alta nos últimos anos. Esse fato revela que os sistemas partidários tradicionais estão desmoronando, o que atribuo a um velho e enrijecido sistema partidário que não se atualiza com a nova realidade social. Cabe destacar que muitos dos partidos emergentes se apresentam como “antisistema”, ‘antiestablishment” ou “antielite”. São populistas na medida em que a imagem que projetam da política é a de uma elite que atrai, abusa e explora pessoas. Essa imagem populista da política está associada a rejeição da democracia representativa.

Outro sinal relevante se percebe no fato de que as opiniões políticas ficaram mais polarizadas, com eleitores deslocando-se para os extremos, talvez em razão dos partidos tradicionais terem perdido contato com seus apoiadores. As pessoas, quando entendem que todos os políticos profissionais são a mesma coisa, egoístas, desonestos ou corruptos, se viram contra eles, estejam à esquerda, à direita ou no centro. Cabe destacar que pesquisas recentes apontam para o fato de quê cerca de dois terços dos entrevistados acreditarem que “os políticos são corruptos e que eles atuam em defesa de seus interesses pessoais ou de grupos”. Daí surge nas pessoas o sentimento de decepção, aversão, raiva e indiferença. Esse crescente sentimento tem sido responsável pelo relevante percentual de abstenção eleitoral. Resta saber se essa crescente rejeição aos partidos e aos políticos é apenas um fenômeno transitório ou duradouro. Entendo ser difícil afirmar até que ponto as recentes transformações políticas vêm da insatisfação geral a partidos e a políticos, bem como o tempo que esse sentimento irá permanecer! Afinal, “o povo”, que muitos atribuem a uma entidade no singular, não existe; o que existe são pessoas, no plural, com interesses, valores e padrões diferentes.


Amaury Cardoso

Graduação em Física, Pós Graduação em Gestão Pública, Pós Graduação em Políticas Públicas e Governo, Pós Graduação - MBA em Marketing, Comunicação, Planejamento e Estratégia em Campanhas Eleitorais, Especialização em Política e Estratégia, Especialização em Ciências Políticas.

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